João Lima – SENAC-PE

O queijo está presente na mesa dos pernambucanos de diversas formas: cru, assado, empanado, com mel de engenho, orégano, como recheio para itens como tapioca, no baião de dois, nos sanduíches e em tudo mais que a imaginação gastronômica permitir. Das variedades de queijos existentes no mercado, há alguns que são mais característicos da nossa região e que fazem parte da nossa cultura, como o queijo de manteiga, queijo do reino e o mais presente no dia a dia: o queijo de coalho.

A história da produção de queijo coalho no sertão de Pernambuco remonta a mais de cem anos de história. Sua produção, inicialmente, era atividade exclusiva das mulheres, que também se ocupavam das demais atividades domésticas: alimentação da família, horta, cuidar dos animais e comercialização dos produtos excedentes, não consumidos pela família.

A descoberta do queijo deu-se por meio da evolução de três processos: a obtenção do leite animal para consumo humano através da ordenha manual, a influência do fogo e do calor sobre os alimentos e a descoberta da enzima digestiva extraída do estômago animal que transforma o leite em coalho.

A produção de queijo desenvolveu-se ao longo da história, motivada pela dificuldade em armazenar e transportar sua matéria-prima: o leite. Em Pernambuco, é provável que essa prática tenha surgido pelo mesmo motivo. As técnicas iniciais de produção vieram trazidas pelos colonizadores, e ao longo do tempo foram sendo aperfeiçoadas pelas famílias que o produziam.

A princípio, sua produção era limitada apenas para consumo doméstico ou como forma de presentear parentes e amigos. Nas regiões montanhosas da Europa, onde há frio e neve em boa parte do ano, e também no alto sertão Pernambucano, essa tecnologia proporcionou o acesso a fontes de proteína durante todo o ano, mesmo em condições climáticas desfavoráveis.

A primeira citação da fabricação de queijo no Brasil foi atribuída ao Estado de Pernambuco em 1581, através da obra do inglês Robert Southey (1774-1843)

O gado e a fabricação de queijo já estavam presentes na capitania de Pernambuco desde o século XVI. O gado vacum veio das ilhas do Cabo Verde na África para terras brasileiras, e aqui se adaptou muito bem. Por esse motivo, a pecuária se tornou próspera em Pernambuco.

Por que a pecuária deu certo no agreste e não na zona da mata?

Não era interessante criar pasto para vacas e bois na zona da mata pernambucana, pois essa região destinava-se exclusivamente à plantação de cana de açúcar, riqueza abundante por muito tempo valorizada para nosso estado. Então, a região subsequente melhor indicada para isso seria o sertão pernambucano. Por isso essa região tornou-se polo para produção do leite e seus derivados.

Na zona da mata, a criação de bois e vacas destinava-se aos trabalhos agrícolas. A cana de açúcar foi por muito tempo o principal produto de exportação do Brasil colônia e fonte de riqueza para os mais ricos da época, então a preocupação em manter distante a criação de gado, que prejudicava a plantação da cana. A carta régia de 1701 bateu o martelo em relação à criação do gado, proibindo sua atuação a menos de dez léguas (aprox. 50 km) da costa litorânea.

A pecuária no sertão de Pernambuco rendeu e ainda rende muito mais do que a obtenção do leite e seus derivados. A chegada do boi na época colonial abriu caminhos entre o litoral e o sertão para a expansão territorial, fixação de vilas e pequenos centros urbanos pelo caminho, além de dar condições aos pequenos produtores de criar seu gado e obter meios de subsistência.

O queijo de coalho produzido no sertão não estava nas preferências culinárias dos consumidores privilegiados dos engenhos, porém com o passar do tempo, devido aos cuidados em relação a boas práticas de fabricação e saúde dos animais, o queijo passou de produto desvalorizado a item indispensável na mesa do pernambucano.

A região agreste do Estado de Pernambuco consolidou-se como centro produtor leiteiro devido ao seu clima ameno e mais frio que o restante do sertão. Sua altitude proporciona ótimas condições para criação de gado leiteiro e plantação de palma forrageira, que se tornará, ao longo do tempo, alimentação base para o gado. A cidade de Garanhuns tornou-se importante polo comercial para os produtos derivados da pecuária: leite, couro e queijo de coalho. Os imigrantes fixados lá, principalmente italianos, trouxeram técnicas para fabricação de aproximadamente 15 tipos de queijo.

A região da bacia leiteira de Pernambuco produz cerca de 2 milhões de litros de leite por dia. Cerca de 60 mil famílias produzem queijo coalho na região.

Há uma mobilização, desde 2000, para que a produção do queijo coalho do agreste pernambucano receba o selo de Indicação Geográfica. Esse selo visa garantir a procedência e valorizar suas principais características que podem ser atribuídas ao processo de produção, sabor particular, influências do clima, conhecimentos humanos geralmente ligados a processos tradicionais, técnicas de preparo etc.

Algumas características instituídas pelo CQP (Associação de certificação do Queijo de Coalho de Pernambuco) são a raça das vacas, sua alimentação, que deve incluir a palma forrageira, elementos relativos à procedência, qualidade e transporte da matéria-prima. Tecnologias de fabricação e características do queijo devem ser respeitadas para assegurar a Indicação Geográfica.

Foram definidos 27 municípios que podem ter a indicação geográfica para seus queijos: Águas Belas, Bom Conselho, Buíque, Caetés, Capoeiras, Garanhuns, Iati, Itaiba, Lajedo, Paranatama, Pedra, Saloá, Tupanatinga, Venturosa, Alagoinha, Altinho, Belo Jardim, Cachoeirinha, Ibirajuba, Pesqueira, Poção, Sanharó, São Bento do Una, São Caetano, Tacaimbó, Arcoverde e Manari.

O leite utilizado para fabricação do queijo de coalho é o integral, podendo ser parcialmente desnatado, visando à quantidade final de gordura no queijo pronto. O leite passa por diversas análises quanto a sua qualidade para produção de queijo de coalho artesanal. Em seguida, o leite é aquecido entre 30°c e 35°c, para facilitar a coagulação, e o agente coagulante, geralmente industrializado, é adicionado. O tempo médio para coagulação do leite é de 30 a 40 minutos.

Na sequência, a coalhada é cortada para facilitar a desoragem e ajustar a acidez final do produto. Depois disso, a massa do queijo é colocada em fôrmas e prensada por 15 a 30 minutos. A salga pode acontecer depois dessa etapa ou durante a enformagem do queijo. Geralmente a validade dos queijos de coalho produzidos de forma artesanal é de 20 dias, sempre armazenados refrigerados.

PRODUÇÃO DO QUEIJO DE COALHO

Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-Fluxograma-de-fabricacao-queijo-Coalho-no-Estado-da-Paraiba_fig1_320538623

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