Patrícia Araújo da Silva - SENAC -PI

Os historiadores afirmam que o sabor da nossa comida foi estabelecido pelos índios. O hábito que hoje temos de usar o milho, a farinha de mandioca, a macaxeira cozida com sal, o mel e a pimenta da terra foram herdados dos indígenas. Além disso, também tivemos influências dos africanos e portugueses. Com a chegada destes povos houve um interesse pela carne vermelha e pelas frutas locais, como o bacuri.

Em cada canto do Piauí, existe uma receita própria. A carne de sol e o capote são típicos de Campo Maior; o bode assado na brasa concentra-se mais em municípios da região de Picos onde os rebanhos são comuns; a abobrada é típica em Corrente. Em Teresina, encontramos Maria Isabel e a paçoca, um tipo de mistura de carne seca e farinha que é temperada à base de cebola branca e pilada num pilão de madeira, muito usado por tribos indígenas e comunidades interioranas.

Comidas tradicionais: Maria Isabel; Arroz com galinha ou capote; Arroz com bode ou carneiro seco; Paçoca; Carne-de-sol; Carne-seca de gado ou criação (carneiro ou bode); Galinha Caipira.

Doces típicos e compotas caseiras são os produtos mais conhecidos na mesa do teresinense. O doce da casca de limão azedo é o mais típico do Piauí. As compotas de goiaba, manga, caju, mangaba, bacuri, buriti, groselha, casca de laranja e muitos outras compõem o menu de doces da região.

Há uma riqueza de frutas na região que rendem verdadeiros drinques naturais. O Piauí é maior produtor de caju da região e ganha com isso, a oportunidade de produzir um produto tipicamente local: a cajuína. A bebida é conhecida como o típico refrigerante piauiense. Em maio de 2014, o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural/ Iiphan registraram a cajuína como Patrimônio Cultural Brasileiro de Produção Tradicional de Práticas Socioculturais. Outras bebidas: vinhos-de-caju, abacaxi e de outras frutas; licores – de caju, de tamarindo, de tangerina, de jenipapo, de maracujá, etc. e cachaças – diversos tipos, com misturas as mais variadas.

ARROZ MARIA ISABEL

A lenda de sua origem diz que o arroz Maria Isabel surgiu entre as famílias pobres e numerosas do interior do estado. O prato começou a ser preparado para que as mulheres se alimentassem de carne, pois, na época só os homens a consumiam. Foi então que uma mãe decidiu pegar um pedaço de carne do alforje do marido que ia trabalhar, partiu em cubinhos e cozinhou com arroz para servir a toda a família e decidiu dar o nome das duas filhas ao prato: Maria e Isabel.

Segundo Ceres Mara Macedo, gestora do Sebrae-PI, é impossível precisar quando e onde a receita foi criada. Acredita-se, porém, ter sido entre as décadas de 1920 e 30, em Campo Maior, a 84 quilômetros de Teresina. Hoje, funcionam na sede daquele município muitas salgadeiras, casas que curtem e vendem a carne de sol, ingrediente do prato. Consumidores e comerciantes aparecem ali para comprar o que consideram “a melhor do Brasil”.

De acordo com o escritor Enéas Barros, em seu livro “O Escravo e o Senhor da Parnahyba”, “a mistura de arroz com o charque foi algo natural que ocorreu entre os escravos de Simplício Dias”. A obra cita que, em homenagem ao poderoso senhor, os escravos batizaram o prato de “maria-isabel”, nome da esposa de Simplício. Essa história relembra um pouco a vida de Simplício Dias da Silva, rico comerciante e fazendeiro que viveu em Parnaíba entre o final do século 18 e começo do século 19 e sua história com o escravo Anselmo, chamado no dia-a-dia de Tuca que tocava violino.

O Festival Gastronômico Maria Isabel, realizado em Teresina, exalta a gastronomia do estado e apresenta pratos tipicamente comuns nas mesas regionais.

PREPARAÇÕES – No Piauí a carne de sol é muito apreciada, tanto nas residências quanto nos restaurantes. Existem diversas preparações utilizando-a, como Maria Isabel; paçoca; recheios de salgados; acompanhamento com cuscuz, macarrão, pão e outros. O município de Campo Maior é um dos locais que mais produz e vende no estado, considerado a terra da carne de sol, bastante conhecida na região, possui sabores e texturas agradáveis aos consumidores.

O nome Campo Maior deve-se aos imensos campos que estão presentes em nossa região, grandes campinas foram o motivo principal da instalação de muitas e grandes fazendas de gado. A terra logo se encheu de gado vacum. A pecuária era a fonte que mais jorrava riquezas ao povo de Campo Maior. Se houve muito gado, isso se deu pelo fato da terra ser favorável, oferecendo grandes campinas e muito pasto. Como o fazendeiro não dispunha de energia elétrica, a carne era conservada com sal e posta ao sol, para secar mais rapidamente e ser armazenada em pequenas e médias quantidades. Aí estava a carne de sol de Campo Maior, que se tornou lendária no Piauí inteiro.

A carne de sol é elaborada pela ação combinada de salga e desidratação parcial da carne bovina. Em tempos remotos, antes da popularização da conservação de alimentos pelo frio, altas concentrações de sal e secagem ao sol produziam carne salgada e seca, e consequentemente, com vida-de-prateleira relativamente longa, mesmo quando armazenada em temperatura ambiente, se comparada à carne fresca.

A salga é um dos métodos mais antigos de conservação de alimentos conhecida pela redução da atividade de água e baseia-se na utilização de cloreto de sódio, que em concentração adequada, diminui ou até mesmo impede a decomposição do alimento pela ação de microrganismo. O processo de conservação pela salga ocorre devido à desidratação osmótica, que a água sai do alimento, ocorrendo a entrada de cloreto de sódio. Nesse processo, o teor de água livre no alimento reduz, promovendo, portanto, a redução do crescimento de microrganismos.

Nas pequenas comunidades do Brasil do século XVI, era comum o abate de uma rês exceder a capacidade de consumo diária de seus poucos habitantes, demandando o desenvolvimento de métodos que possibilitassem preservar a carne obtida de modo a garantir seu aproveitamento integral por períodos mais longos.

O surgimento da carne de sol, em resposta a essa demanda, foi resultado da combinação do manteamento das carnes com a salga e a desidratação, dois processos utilizados na preservação de carnes desde de tempos imemoriais. A diminuição da espessura muscular pelo manteamento tinha por objetivo acelerar a penetração do sal e a saída de umidade. O ajuste dos tempos e teores de sal empregados na salga, bem como dos tempos e condições de dessecação permitiam a obtenção de produtos com distintos prazos de conservação, além do aspecto, sabor e textura diferenciados.

A carne de sol é elaborada, na quase totalidade, em pequenos estabelecimentos que se dedicam especificamente a essa atividade e em praticamente todos os açougues nordestinos, razão pela qual sua produção não faz parte das estatísticas oficiais. Pela inexistência de padrões estabelecidos através de uma legislação, esse tipo de produto é encontrado nos mercados com quantidades variadas de cloreto de sódio e umidade, fazendo com que tenham variação na qualidade sensorial, nutricional e principalmente microbiológica.

A carne de sol não pode ser considerada um produto para comércio em larga escala, porque a sua vida de prateleira é muito curta, visto que tem baixo teor de cloreto de sódio, logo alta atividade de água e alto teor de umidade, de modo que as suas condições físicas não impedem a deterioração ou produção de toxinas microbianas que, em temperatura ambiente, ocorre em poucos dias. Ela não possui um padrão de identidade e qualidade, nem é objeto de portarias específicas que disciplinem sua produção. Para conquistar novos consumidores das regiões mais abastadas do país, a carne de sol tem que ter sanidade assegurada, vida de prateleira estendida, aparência, textura, gosto e aroma agradáveis.

Apesar do nome carne de sol, raramente exposta ao sol no processo de fabricação; pelo contrário é deixada em locais cobertos e bem ventilados. Portanto, o antigo nome carne- de- sereno melhor expressaria o processo pelo qual a carne de sol é preparada.  Assim como não há no Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal- Riispoa, qualquer artigo que forneça um conceito caracterizando- a de forma legal, assim sendo a comercialização deste tipo de carne, com tal denominação “carne de sol” torna-se uma prática danosa a saúde do consumidor, que não tem aparo legal para as características que devem estar presentes em um alimento seguro com qualidade e identidade. A elaboração deste produto segue então, conceitos ou normas típicas regionais.

É de extrema importância, mais estudos sobre esse alimento e parcerias para incentivar o governo a criar um padrão de identidade e qualidade, contribuindo para desenvolvimento de novos produtos e contribuir para fortalecimento desse tipo de atividade, assim como para o produto do interno bruto (PIB) do Brasil, visando obter melhorias na qualidade nutricional e sensorial, necessárias para garantir, entender e estender a satisfação dos consumidores.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

COSTA, Elizabete Lourenço da Costa; SILVA, João Andrade. Qualidade Sanitária da Carne de sol Comercializada em Açougues e Supermercados de João pessoa-PB.  B.CEPPA, Curitiba, v. 17, n. 2, p. 137-144, jul./dez.1999;

COUTINHO, Jean Pereira. Produção e Caracterização da Carne de Sol da Carne de Caprinos da Raça Anglo Nubiana Elaborada com Diferentes Teores de Cloreto de Sódio. Dissertação do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB – Campus de Itapetinga, 2011;

FARIAS, Salete Maria de Olinda Carvalho. Qualidade da Carne de sol Comercializada na Cidade de João Pessoa. Dissertação de mestrado no curso de Tecnologia de alimentos-Universidade Federal da Paraíba-UFPB, 2010;

JÚNIOR, Bento da Costa Carvalho. Estudo da Evolução das Carnes Bovinas Salgadas no Brasil e Desenvolvimento de um Produto de Conveniência Similar à Carne-de-sol. Tese de doutorado apresentada à Faculdade de Engenharia de Alimentos- UNICAMP, 18 de novembro de 2002;

MENNUCCI, Tatiana Almeida. Avaliação das Condições Higiênicos Sanitários da Carne-de-sol Comercializado em “Casas do Norte” no município de Diadema-SP. Dissertação de Pós-graduação em Saúde Pública para Obtenção do Título de Mestre na Faculdade de Saúde Pública- USP, 2009.

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